Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)
Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumidas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.
(Receita de Ano Novo - Carlos Drummond de Andrade)
Com esse clima de Ano Novo, época de promessas e mudanças, e com aulas em pleno Janeiro, eu estive pensando em como a Morfologia pode nos servir de exemplo para algumas situações.
Por exemplo, no dia 31 de Dezembro mandamos mensagens e ligamos para os nossos amigos e familiares desejando-lhes muitas coisas boas, inclusive EQUILÍBRIO.
Aí você me pergunta:
- Sarah, o que isso tem a ver com Morfologia?
E eu te respondo:
- Equilíbrio me lembra as Desinências. Vamos relembrar o que é e quais são...
Desinências, segundo o Valter Kehdi, "são os morfemas terminais das palavras variáveis. Servem para indicar as flexões de gênero e número (desinências nominais), e de modo-tempo e número-pessoa (desinências verbais)." As desinências são colocadas logo a direita do radical...
- Mas, Sarah, o que vem a direita do radical não é o sufixo?
- Está certo, mas existem algumas diferenças básicas entre Sufixo e Desinência, vejamos:
Vamos usar um trecho do texto lido acima para exemplificar melhor essas diferenças:
Para você ganhar belíssimo Ano Novo
O sufixo apenas nos possibilita criar novas palavras, como na palavra Belíssimo, se tirarmos o sufixo -íssimo, torna-se Belo.
Já as desinências colocam belíssimo concordando com o objeto Ano Novo em gênero e número; e o sujeito você e o verbo ganhar concordam em número e pessoa.
- É exatamente nesse momento que desinências são exemplos de equilíbrio para mim. Porque se nós tirarmos essas desinências a oração com certeza vai perder um pouco do seu equilíbrio, ou seja, concordância. Quer ver um exemplo? Se eu passar o verbo ganhar para o plural ganharem e mantiver o sujeito no singular, a oração não vai estar concordando de acordo com a norma padrão da língua portuguesa, ou seja, vai estar desequilibrada. Exemplo disso na nossa rotina é quando tentamos fazer várias coisas ao mesmo tempo e nenhuma sai realmente boa, porque não há uma concordância entre elas. Perceberam? Agora vamos seguir com a explicação:
Desinências de gênero podem ser expressas atrás de três modos, são eles:
- Flexão, por exemplo: garota e garoto.
- Derivação, quando há acréscimo de sufixo no masculino ou no feminino, por exemplo: conde e condessa.
- Heteronímia, quando o masculino e o feminino são representados por dois vocábulos, por exemplo: vaca e boi.
Desinências de número é bem simples. Por exemplo,
carreira e
carreiras, o plural é caracterizado pelo -s e o singular não possui nenhuma desinência específica. Caso seja uma palavra paroxítona terminada em -s, podemos considerar um alomorfe "vazio", por exemplo,
os óculos.
Ainda falta desinência verbal, mas vou deixar para a próxima postagem.
GÊNERO TEXTUAL
O gênero receita informa a fórmula de um produto, detalhando os seus ingredientes e o seu preparo. Trata-se, portanto, de uma sequência de passos para a preparação de alimentos. Com certeza todos vocês devem conhecer esse gênero, pois quem aí nunca pediu a receita do pavê da vovó? Então já conhecem bem a estrutura, certo? Título, ingredientes, modo de preparo, porções, ilustração da receita...
Mas observe que na nossa receita não existe esta estrutura explícita e nem fala sobre comida, nossa receita tem uma estrutura mais poética, que aconselha e indica o que devemos fazer no Ano Novo.
Não é divertido como nossa língua portuguesa e nossa literatura estão tão presentes no nosso dia a dia?
Até a próxima, queridos!